quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Gado Rastreado, Caminho sem volta

01/03/2010

Eles nascem já monitorados por especialistas, logo ganham carteira de identidade e entram para um banco de dados que acompanhará toda a sua trajetória, inclusive depois da morte. O rastreamento do gado, do pasto às prateleiras dos supermercados, toma força no país. A garantia de origem da carne e a certeza de que ela é de qualidade passaram a ser exigências do consumidor brasileiro, antes mesmo de se tornarem requisitos para o produtor alcançar o comércio internacional. E para não ser excluído desse mercado, pecuaristas dão os primeiros passos para adoção de um sistema eletrônico de coleta e armazenamento de dados.

Não será de um dia para outro que todo o rebanho nacional poderá ser identificado. Afinal de contas o Brasil tem  o maior rebanho comercial do mundo, com quase 190 milhões de cabeças de gado. O processo, contudo, precisa ser acelerado. Missão de técnicos da União Européia(UE) chega, esta semana, ao Brasil, líder no ranking de exportação de carne bovina, para verificar fazendas e plantas frigoríficas habilitadas à exportação. A inspeção tem como objetivo identificar justamente se as exigências de rastreabilidade estão sendo cumpridas, para que as relações comerciais sejam mantidas. Entre amanhã e o dia 15 receberão as visitas de técnicos europeus fazendas de Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, São Paulo, Paraná, Santa Catarina, e Rio Grande do Sul.

Para o secretário da Agricultura, Pecuária e Abastecimento(SEAPA) de Minas Gerais, Gilman Viana Rodrigues, Minas está mais que preparada para receber os fiscais da UE. "O estado tem pouco mais de 10% do rebanho brasileiro, mas representa um terço  das fazendas credenciadas do  país. Das 1897 propriedades da lista, 639 estão aqui. Não é à toa que somos os maiores exportadores para a UE. Nosso trabalho é rigoroso, por isso não temos nada a temer", disse. Ele explicou que os técnicos checam a situação das propriedades enquadradas no Sistema Brasileiro de Identificação e Certificação de Origem Bovina e Bubalina (Sisbov) e verificam a situação sanitária. Entre as exigências previstas no programa de rastreabilidade está a adoção de brincos ou chips eletrônicos para identificação dos bovinos, bem como o seu registro por um período mínimo de 90 dias na base de dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento(Mapa).

A exigência alimenta o mercado. Rastrear o gado do pasto até o prato é o negócio da mineira Safe Trace. Dois jovens da Univerisdade Federal de Itajubá criaram em 2005 - quando o mundo sofria surtos do mal da vaca louca, que restringiu a circulação de carne produzida em países acometidos pela doença, reduzindo sensivelmente o comércio internacional - uma tecnologia de identificação por rádio frequência para informar ao cliente a procedência da carne. A Fir Capital, gestora de fundos de Venture Capital do qual faz parte o mineiro Guilherme Emerich, comprou a idéia e aperfeiçoou  o modelo. "O projeto tinha uma fragilidade: identificava o caminho somente até o frigorífico. Hoje, é possível rastrear desde o nascimento até o pedaçõ da carne na bandeja do supermercado", disse Rodrigo Argueso, economista que era sócio da Fir Capital até assumir a presidência da Safe Trace.

Quase cinco anos e R$ 5 milhões de investimentos depois, os parceiros chegaram ao produto final: um chip que pode vir em forma de brinco eletrônico ou do chamado bólus, uma cápsula de cerâmica engolida pelo boi. Com a implantação, as informações são cadastradas e ficam disponíveis na internet. São dados como a propriedade em que nasceu, sexo, peso, vacinas. Na prateleira do supermercado, o consumidor encontra a bandeja de carne com uma etiqueta com o código de barras e um número que remete ao animal que originou o produto. "O sistema garante o cumprimento das exigências da União Européia e também atende o consumidor brasileiro, que a cada dia mais se assemelha com a demanda do consumidor europeu", afirmou. O supermercado Verdemar foi o primeiro a oferecer aos clientes carne rastreada da fazenda à gôndola com a auditoria da Safe Trace. O SuperNosso foi atrás. Para o consumidor final, o quilo da carte custa até R$ 0,50 mais caro. Mas, ao que tudo indica, clientes estão dispostos a pagar mais.


Controle dá segurança à seleção de animais


Outra empresa que ganha espaço no mercado de rastreabilidade é a Compex. A companhia desenvolveu o  Sistema de Rastreamento de Rebanhos(SISRAR) a pedido da Agropel, fazenda produtora de gado de corte localizada em Paracatu, no Noroeste de Minas Gerais. A ferramenta permite que o pecuarista faça o controle da sanidade e do desmpenho individual de cada animal, o que facilita a obtenção da certificação para venda à abatedores homologados para exportar. "É tudo feito com código de barras, como se o gado fosse um produto do supermercado que ao pasar pelo caixa tem todos os dados já registrados", explica Paulo Roberto Mingrone, da equipe de desenvolvimento de aplicações da Compex.

Segundo ele, o computador não vai ao pasto, mas sim um leitor portátil que pode cair no chão e tomar chuva, com autonomia para funcionar por cerca de uma semana sem precisar ser recarregado. "O equipamento dispensa o apontamento manual. As planilhas preenchidas à mão estão sujeitas a erros", diz. Na prática, quando o animal nasce é colocado um brinco amarel que leva um código de barras co 15 dígitos. Qualquer informação sobre o gado - data de nascimento, vacinação, peso, entre outros dados -  vai para esse arquivo individual. O sistemas permite o cadastro de até 50 mil animais. O custo é acessível. Cada coletor custa U$$1,6 mil, somada a mensalidade de R$ 350 referente à licença de uso do software.

De acordo com Caroline Rovena, proprietária da fazenda Rio Grande, controlada pela Agropel, as melhorias vão além do simples fato de poder rastrear o animal. "Todos os procedimentos de pesagem, vacinações, exames, montas e inseminações são registrados e ficam no histórico de cada animal. Isso possibilita a implantação de um programa de melhoramento genético", explica. Há ainda, a vantagem de identificação de roubo de cabeças e separação dos lotes de animais em operações de vacinação.

Ela critica as brechas no controle sanitário do país. "A rastreabilidade ainda não é obrigatória desde o nascimento do animal. A legislação exige a identificação de somente 90 dias anteriores à venda. Por isso, sabe-se de qual propriedade a carne é, mas não se tem idéia sobre como o animal foi criado, o que comeu, o que tomou de remédio. Então, esse trabalho que fazemos hoje pode parecer que é perdido, mas o mercado não terá saída", pondera Luiz Henrique Amadeu, gerente de operações da Divisão de Cerâmicas Avançadas da Saint-Gobain para a América Latina, acredita que a difusão da rastreabilidade no país será como o do celular. "A tecnologia demora ser introduzia, mas vai ganhar espaço rapidamente", diz.

Em 2005, a Saint-Gobain do Brasil, Divisão Cerâmicas Avançadas, desenvolveu um material cerâmico usado na identificação eletrônica animal. "A previsão era de que o produto seria comercializado inicialmente na Europa. Porém, no Brasil, foi identificada a necessidade de uma solução completa, incluindo o identificador eletrônico e os demais equipamentos periféricos necessários ao funcionamento do sistema de identificação(leitoras e antenas) e que fossem totalmente fabricados em território nacional", explicou. Assim, 2006, teve início o desenvolvimento da linha de produtos e foi criada a divisão Certag, que passou a ser comercializada em 2008. "Existem diferentes instrumentos: brinco eletrônico, código de barras e tem o sistema intrarruminal. Este é inviolável", defende.

Amadeu explica que a cápsula de cerâmica com o chip é introduzida pela boca por meio de um aplicador e se aloja no estômago. Fica presa ali em função de suas dimensões(68 milímetros e 72 gramas), ou seja, não há possibilidade de ser expelida pelo animal."As informações são lidas por rádio frequência.  É o mesmo sistema anti-roubo de lojas de shoppings. A rastreabilidade, reconhecida na Comunidade Européia, está na identificação do animal", compara.(PC)


O que diz a Lei

A lei da rastreabidade na cadeia produtiva das carnes de bovinos e de búfalos(nº 12.097/2009) foi sancionada no fim do ano passado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com as novas regras, os agentes econômicos que integram a cadeia de produção ficam responsáveis, em relação à etapa de que participam, pela manutenção, por 5 anos, dos documentos fiscais de movimentação e comercialização de animais e produtos de origem animal que permitam a realização do rastreamento para eventual consulta da autoridade competente. Os controles deverão ser implementados até novembro de 2011.

Fonte: Safe Trace

fonte: http://www.safetrace.com.br/st2010/Pagina.do?idSecao=17&idNoticia=145